Tentar responder a pergunta acima pode deixar muita gente desanimada e pessimista… Com efeito, se observarmos as manchetes locais, sejam atuais ou de 10 ou mesmo 20 anos atrás, vamos encontrar o nosso sistema de saúde como personagem quase central, com menções sobre carências diversas, tais como, leitos hospitalares, medicamentos, pessoal, recursos financeiros etc. O mesmo nos dias de hoje. O atual governo já completou meio ano de vigência e, apesar das promessas mirabolantes de campanha, trouxe pouca novidade positiva ao cenário, assoberbado como está pela crise hospitalar, pelo déficit financeiro, pela sofreguidão corporativa, pela descrença generalizada da população, pela incapacidade de desenvolver planos reais de mudança no sistema. O mesmo, portanto, que em dias, meses (e anos) passados. Mas sempre caberá a indagação: será que isso tudo tem jeito? Não sucumbamos ao desânimo, entretanto. Experiências de outas cidades e países, além da palavra de especialistas, mostram sim, um caminho a seguir. Mas para isso é preciso ter decisão política e, acima de tudo, muita coragem para agir e fugir da situação de eterna acossada, a qual a SES-DF enfrenta a décadas. Vamos lá…
Eis um pequeno decálogo da BOA GESTÃO EM SAÚDE:
1. MODELO GERENCIAL: Agilização e transparência dos processos de gasto de recursos de qualquer origem, mediante instrumentos de aferição de produtividade, eficiência, oportunidade e impacto sobre a saúde da população, com reestruturação dos processos de licitações, aquisições e compras, controle de estoque e oferta de insumos para a saúde, com mecanismos eficientes, descentralizados e transparentes, com foco particular nos medicamentos e insumos essenciais.
2. MODELO DE ATENÇÃO: Definição e comprometimento com um modelo assistencial sintonizado com a Política Nacional de Atenção Básica (PNAB), qualificando a AB como instância efetiva de coordenação do sistema, com modernização do modelo assistencial mediante estratégias de qualificação técnica; utilização de tecnologias de gestão da clinica; incentivo às inovações assistenciais; formação de redes de atenção; incorporação de tecnologias inovadoras de atendimento em centros urbanos e remotos; acautelamento quanto à terceirização de serviços públicos, ao mesmo tempo desenvolvendo capacidades para realizar sua fiscalização e controle; busca de sinergia entre as diversas políticas sociais, em associação com a definição de um modelo para a atuação sinérgica entre o setor público e organizações sociais e semelhantes (ver último tópico desta série), com decisão política decidida e sustentável.
3. RECURSOS HUMANOS: Restruturação das carreiras profissionais envolvidas com a atenção pública na saúde, que viabilize a contratação, reposição e a qualificação dos recursos humanos para cobertura das carências existentes, porém utilizando instrumentos de responsabilização contratual de cumprimento de metas assistenciais e gerenciais, com foco em produtividade e qualidade das práticas profissionais, rejeitando formas ilegais ou ilegítimas de vínculos de trabalho, bem como o laissez faire e o corporativismo atrasado habituais.
4. BLINDAGEM: Redução radical das nomeações em cargos comissionados e de confiança, valorizando o pessoal de carreira, já que aquelas representam nítidos expedientes de clientelismo partidário, antagônicos às tentativas de conferir tratamento profissionalizado e isento à gestão saúde.
5. ENTORNO: Retomada das negociações com os estados vizinhos e seus municípios fronteiriços com o DF, com inclusão obrigatória do Ministério da Saúde, para definição e compartilhamento de responsabilidades, além da formação de um verdadeiro Sistema Regionalizado de Saúde do Entorno do DF, organizado em rede, mediante estrutura administrativa Inter federativa (fundação pública, consórcio, associação ou similar), sob gestão profissional meritocrática.
6. PARTICIPAÇÃO SOCIAL: Reestruturação da política de participação social em saúde, fugindo da verdadeira camisa de força de Lei 8142, de forma não só a romper com as influências corporativas, mas valorizar e incrementar o poder da população tomar decisões e fazê-las valer de fato e de direito, com base local e ampliação dos mecanismos de participação formais vigentes e utilização de tecnologias de informação e comunicação..
7. AUTONOMIA: Descentralização efetiva da gestão pública, com autonomia administrativa e financeira das unidades hospitalares e das gerências regionais, além de metas de produtividade e impacto bem definidas em instrumentos contratuais.
8. CAPACITAÇÃO DA FORÇA DE TRABALHO: Incentivo à formação de profissionais de saúde, seja mediante protagonismo da ESCS ou outras instituições – utilizando o papel de indução que a SES-DF tem sobre o mercado de trabalho em saúde na cidade – tendo como focos as necessidades de saúde da população e uma política de saúde fundada no modelo da atenção básica coordenadora de um sistema constituído em rede.
9. FLEXIBILIZAÇÃO DA GESTÃO: aspecto essencial da gestão pública é buscar formas alternativas de utilização de recursos públicos, sempre dentro da lei, mas fugindo do emaranhado burocrático improdutivo imposto pelas “leis de ferro” do sistema (Estatuto do Funcionário Público – L 8112; Contratos e Licitações – L. 8666, além da Lei de Responsabilidade Fiscal). Dentro deste túnel restritivo é quase impossível administrar. Pode ser coisa polêmica no Brasil, mas no resto do mundo (civilizado) é apenas rotina. Exemplos recentes em Brasília, combatidos por muitos (pelos sindicatos, naturalmente…), além de alguns setores do Ministério Público, foram as iniciativas de contratação de serviços no Hospital da Criança e da criação do Instituto de Gestão em Saúde (IGES). O problema não é exatamente este, o da criação de alternativas gerenciais, o problema é de outra natureza: gestores públicos incapazes de realmente gerenciar adequadamente os serviços. Não o fazem com seus próprios serviços e por consequência menos ainda em relação ao que contratam com terceiros.
10. CORAGEM NA DECISÃO POLÍTICA, acima de tudo, confrontando o poder corporativo sindical e dos partidos políticos, em nome do bem estar comum e não de segmentos específicos, buscando ao mesmo tempo soluções que não sejam “mais do mesmo”, mas sim portadoras de inovações reais, testadas cientifica e empiricamente. A questão é de gestão, flexível, inteligente, eficaz, transparente, sem fugir aos desígnios legais – e isso é possível, sim!

