A atenção básica é essencial no controle da Covid-19, no DF e em toda parte (mas sem informação não há solução…)

A OPAS – Organização Panamericana de Saúde, representação nas Américas daquela mesma Organização Mundial da Saúde que Trump rejeita, com a devota imitação de seu admirador tropical, todavia segue incólume no Brasil e vem organizando uma série de debates on-line (pois afinal estamos, ou deveríamos estar em quarentena…), inclusive com a participação do público, sobre o protagonismo da atenção primária à saúde no enfrentamento da atual pandemia. São apresentadas e debatidas experiências de diversas partes do Brasil, inclusive daqui do DF. Tentei levantar dados, pelo menos quantitativos, sobre o estado atual da Atenção Básica em nossa cidade, mas nem no site da SES-DF, nem no do Ministério da Saúde está sendo possível encontrar este tipo de informação. Isso deve ser bem uma demonstração do apreço e da valorização que se dá no momento atual a esta ferramenta que no mundo todo representa um inequívoco fator de sucesso no controle da pandemia. Conheça a seguir algumas das experiências já apresentadas e discutidas na referida programação da OPAS, dentro de uma iniciativa chamada, muito apropriadamente, aliás, de APS Forte no SUS. As apresentações e debates sobre estes seis casos poderão ser vistos no link ao final.

Preliminarmente, como se sabe, países que reduziram o alcance da atenção primária para colocar os profissionais de saúde nos hospitais de campanha, como a Itália e a Espanha, foram mal sucedidas, porque causaram a interrupção do cuidado às pessoas com sintomas leves de Covid19, também interrompendo aquilo que depende direta e cotidianamente da mesma, conforme lembra, Renato Tasca, da OPAS Brasil. Sendo assim, a estratégia mais correta é a de ampliar este tipo de estratégia, não de a desvalorizar, postergar ou esvaziar, como parece acontecer neste pobre país em que vivemos.

Não custa nada definir o que vem a ser uma Atenção Básica que realmente mereça tal nome.  Não basta, naturalmente, ter uma placa na entrada da Unidade de Saúde dizendo que ela é isso ou aquilo. Placas aceitam qualquer coisa, inclusive absurdos. A AB verdadeira deve ter, no mínimo, os seguintes requisitos: (1) ações de saúde, no âmbito individual e coletivo; (2) abrangência que inclua a promoção e a proteção da saúde, a prevenção de agravos, o diagnóstico, o tratamento, a reabilitação, além da manutenção da saúde; (3) trabalho em equipe, com médico, enfermeiro e pessoal auxiliar, inclusive agentes comunitários de saúde; (4) foco da ação dedicado a populações de territórios bem definidos e explícitos; (5) responsabilização sanitária formal de tal equipe; (6) domínio de tecnologias de elevada complexidade, embora de baixa densidade: (7) capacidade de resolver os problemas de saúde de maior freqüência e relevância no território. Além disso, ela representa o contato inicial dos usuários com o sistema de saúde, orientando-se por princípios tais como universalidade, acessibilidade, coordenação do cuidado, vínculo; continuidade, integralidade, humanização, equidade e participação social. Enfim, tem muita coisa por aí chamada de “Atenção Primária à Saúde”, ou “Atenção Básica”, sem propriamente merecê-lo. Ok assim? 

Vamos, então, às referidas experiências.

Caso 1: A Secretaria Municipal de Saúde de Pelotas-RS se uniu às universidades locais UFPel e UCPel para reorganizar a APS do município no enfrentamento da pandemia, em projeto denominado “Juntos somos mais fortes e podemos mais”. Foi instituído um comitê para planejar e coordenar estratégias conjuntas de fortalecimento da APS para evitar a sobrecarga da atenção hospitalar. A experiência permitiu o trabalho articulado em rede e o mesmo protocolo de organização dos serviços ofertados a toda população.

Caso 2: Um plano de enfrentamento ao coronavírus (primeira onda) foi desenvolvido em Lagoa Santa-MG, na região metropolitana da Capital. A experiência apostou no planejamento para a reestruturação da rede de atenção à saúde do município para enfrentar a pandemia, sendo desenvolvida uma série de ações de adaptações da APS, contemplando medidas de precauções, controle, tratamento e monitoramento da Covid-19, além da continuidade do atendimento aos demais agravos de saúde.

Caso 3: A Gerência de Atenção Primária à Saúde da SES Mato Grosso do Sul, visando apoiar as gestões municipais na Atenção Básica, em modalidade a distância, no combate a pandemia de covid-19, desenvolve estratégias de capacitação para a organização dos serviços, por meio de ferramentas de comunicação à distância. Foi possível capacitar e definir as atribuições dos serviços da APS no manejo e controle da infecção por coronavírus, fortalecendo a resposta dos municípios.

Caso 4: Cuidados aos usuários do grupo de risco para Covid-19. A SMS de Belo Horizonte, considerando a situação especial dos usuários com cardiopatia, diabetes e as pessoas acima de 60 anos, que pesam nos óbitos por Covid-19, buscou oferecer o cuidado diferenciado a tais pessoas durante a pandemia, para o que foi preciso realinhar internamente os processos do modelo de atenção e priorizar o atendimento dos casos mais complexos, visto que os usuários tendiam a deixar de procurar o atendimento nas Unidades do sistema municipal. Assim, a primeira medida adotada foi a elaboração da listagem de usuários com condições crônicas mais complexas, para que as equipes organizassem diretamente seus planos de cuidados a tais indivíduos de maior risco. Também foram instituídos fluxos para atendimentos presenciais e por telemedicina. A auditoria clínica do prontuário foi utilizada para avaliar o usuário, levando em conta outros atendimentos realizados na rede de saúde. As equipes também agregaram os usuários acamados, egressos de hospitais e com uso de medicamentos controlados. Tal metodologia não só padronizou o atendimento aos usuários com condições crônicas como teve boa aceitação da equipe, além de possibilitar a inscrição de mais de 300 médicos no Consultório Virtual de Saúde da Família.

Caso 5: Os profissionais de saúde da Clínica da Família Ana Maria Conceição dos Santos Correia, localizada na zona Norte da cidade do Rio de Janeiro, tiveram que reorganizar a rotina de trabalho para atender e monitorar os usuários com síndrome gripal durante a pandemia. A nova dinâmica começou quando foram registrados os primeiros casos de Covid-19 no município. A equipe se mobilizou para discutir os protocolos e reorganizar o fluxo na unidade, visando a atender os usuários com caso de síndrome gripal e os usuários com condições de saúde emergenciais. Os usuários suspeitos de Covid-19 foram cadastrados em uma planilha que permitiu localizá-los no mapa do bairro. Outra meta foi a realização dos atendimentos das linhas de cuidado como os casos de pré-natal, puerpério e crianças menores de um ano, realização do teste do pezinho e conferência do calendário vacinal. A ferramenta tecnológica utilizada pela equipe, basicamente o Google Maps, possibilitou que os profissionais de saúde tivessem o georreferenciamento dos casos na comunidade para elaborar estratégias de mobilização.

Caso 6: De Ceilândia, aqui no DF, que tem se destacado negativamente em termos de número de casos e óbitos pelo Covid-19, veio a iniciativa “Acesso seguro para profissionais e usuários”. Assim, médicos residentes, junto com a equipe da UBS, desde o início do crescimento da curva de casos, ainda em março, decidiram mudar a forma de acesso à UBS para garantir a segurança dos profissionais e dos usuários, alterando a disposição dos consultórios e as escalas de trabalho da equipe, de forma a acolher usuários suspeitos de Covid-19, com espaço de circulação exclusivo. Os profissionais de saúde se dividiram para recepcionar o usuário com sintomas de síndrome gripal logo na entrada da UBS, reservaram uma sala de atendimento e criaram um grupo de suporte para acompanhar os desdobramentos da consulta. Com a evolução da pandemia na cidade, a demanda na unidade aumentou, levando a UBS ao limite, ainda mais em uma localidade, como Ceilândia, onde existem equipes sem médicos e áreas sem cobertura, com a pior taxa de isolamento social do Distrito Federal, fazendo a demanda na UBS aumentar radicalmente.

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Quer saber mais?

Para acessar as apresentações da iniciativa APS Forte para o SUS: Portal da Inovação na Gestão do SUS (apsredes.org) ou Facebook @inovacaoemsaude.

Para informações sobre a Atenção Básica no DF (defasadas, por não ter sido possível obter informações atuais):

https://saudenodfblog.wordpress.com/2019/06/01/atencao-basica-no-df-ilhas-de-tranquilidade-em-oceano-de-tormenta/

Sobre o conceito de Atenção Básica:

https://saudenodfblog.wordpress.com/2019/04/15/se-a-atencao-primaria-e-tao-importante-para-os-sistemas-de-saude-por-que-ela-nao-decola/

 

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