A invasão evangélica na Saúde Mental

Trago aqui matéria publicada na Revista Questão de Ciência (ver link ao final), que trata de assunto absolutamente pertinente ao momento brasileiro atual, quando um projeto de poder que mistura militarismo, autoritarismo e religião (não necessariamente nesta ordem) vem passando por tentativas de ser implementado no Brasil. Trata-se da questão do uso/abuso de drogas, objeto de respostas simplistas por aqui, como se isso fosse possível. Com efeito, o foco tem sido, nos últimos anos, na defesa da abstinência, com a criminalização e estigmatização dos usuários, o que está no cerne da atuação das chamadas “comunidades terapêuticas” (CTs) dedicadas ao atendimento de pessoas com uso problemático de drogas. Elas são em grande parte mantidas e administradas por organizações religiosas e têm sido alvo de diversas denúncias de violações dos direitos humanos de seus “internados”, ao mesmo tempo que os gastos públicos com sua utilização explodem. De olho nisso, Paula Napolião e Giulia Castro, pesquisadoras da Universidade Candido Mendes, no Rio de Janeiro, realizaram um profundo estudo sobre tais instituições, destacando que elas são geralmente inseridas em denominações religiosas e que vêm conquistando espaço neste campo, graças, sobretudo, à sua aproximação com órgãos públicos e à sua inclusão privilegiada nas políticas de drogas nacionais e locais, com a consequente possibilidade de obter recursos do Estado, em um processo repleto de tensões e ambivalências, com ações mais superficiais do que estruturais, além do mais  inclinadas a conservar o sentido de tais espaços de difusão de princípios morais e religiosos tradicionais, como se isso fosse necessário e suficiente para o processos de cura ou recuperação desses pacientes.

As autoras destacam também que ainda que as comunidades terapêuticas possam ser o único recurso à disposição de famílias pobres para atendimento de pessoas com uso abusivo de drogas, não há evidências de que o “tratamento” oferecido por elas – baseado na abstinência total, no isolamento social, na imposição de fé e na “reforma moral” – seja eficaz, tampouco há meios de medir seus resultados, já que ele está longe de pautar-se por critérios técnicos de avaliação. Advertem as autoras: “Não se trata – é importante lembrar – de um questionamento das boas intenções que certamente animam operadores das CTs, muitos deles voluntários. Trata-se de questionar se o Estado deve investir recursos para promover ‘tratamentos’ altamente controvertidos, oferecidos por instituições privadas de origem confessional e de legalidade duvidosa, ou garantir a todos os cidadãos o acesso a serviços públicos de qualidade, diversificados e capilarizados, que respeitem direitos e necessidades individuais. A menos que se revogue a Constituição de 1988, e que o Brasil se transforme num Estado teocrático, a segunda opção é seguramente a mais adequada”.

 Veja a matéria completa em: Comunidades terapêuticas: a “cura”, e o dinheiro público, nas mãos de Deus | Questão de Ciência (revistaquestaodeciencia.com.br)

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