Da segurança pública em Brasília e no Brasil

Como todo mundo já deve ter lido e ouvido por aí, saiu a edição de 2023 do Anuário da Segurança Pública no Brasil, com dados abundantes e confiáveis sobre variados aspectos relativos a esta política pública (ou ao fracasso da mesma…) no país. Vamos a uma análise sobre tal questão, destacando os dados do Distrito Federal, em termos comparativos com outras unidades federativas. O ideal seria comparar apenas com as capitais, mas isso só é possível em relação a alguns indicadores. O problema da comparação com os estados é que os dados destes refletem realidade bem mais complexa, que reúne não só capital e interior, mas também cidades de porte radicalmente diferente, bem como realidades socioeconômicas e culturais diversas. Isso pode ter como desdobramento uma diluição de algumas das cifras, muitas vezes em desfavor do DF nas comparações.  

Em primeiro lugar o fenômeno das MVI, Mortes Violentas Intencionais, soma de homicídio doloso, latrocínio, lesão corporal seguida de morte e mortes decorrentes de intervenções policiais em serviço e fora, ou seja, o total de vítimas de mortes violentas praticadas com intencionalidade. Em termos nacionais as MVI foram reduzidas em 2,4% entre 2021 e 2022, mas não nos animemos, pois tal indicador ainda se mostra exorbitante perto daquele de outros países. Para nossa vergonha, foram quase 50 mil (!) mortes em 2022, o que é até pouco perto das 700 mil mortes por covid. Tudo isso como consequência ou agravamento pelo bolso-governo que felizmente já se encerrou.

Mas neste caso, Brasília, para nossa felicidade, com seus 10,1% de redução no biênio, não se coloca entre os piores índices, que amazonicamente ficaram com AC, AM e PA. Ao contrário, ocupamos um honroso lugar ao lado de SP e SC. Não estamos também (aliás, bem longe disso) entre as cidades 50 cidades mais violentas do Brasil e, da mesma forma que aquelas do Entorno ou mesmo de todo o estado de GO. Nossa performance na redução das MVI, embora talvez não possa ser comparável à de países mais desenvolvidos, não deixa de ter sido significativa: foram 761 casos em 2011 versus 318 em 2022. Apenas um policial civil foi morto em ação neste período, diferenciando nossa cidade positivamente em relação a outros estados, mas em compensação as mortes decorrentes de intervenções policiais subiram de 6 para 14 no último biênio. Enquanto isso, o registro de armas de fogo aumentou substancialmente em todo o país, com média de 144%, no significativo período de 2017 a 2022 (será por quê?), mas aqui ficamos nos 92% em tal quesito, o que já é um consolo, pela distância dos verdadeiros – duvidosa honraria – “campeões do armamentismo”, que foram SE, TO, RO, PA, ES, todos com mais de 200% de aumento.

Em suma, neste quesito, como em outros que se verão em seguida, o Brasil ainda está pegando o preço que lhe foi imposto pelo bolsonarismo na segurança pública, como se não bastasse a extensa dívida histórica acumulada neste campo.

Quando se analisa as MVI por capitais (o que infelizmente quase não se mostra no levantamento), o que se vê é que a redução obtida em Brasília é equivalente, por um lado, à situação de Goiânia e São Paulo, ou seja, de relativo sucesso. Mas por outro lado se veem situações como as de Maceió, Campo Grande, Cuiabá, Porto Alegre e Palmas, com acréscimos superiores a 15%.

Em relação à produção e MVI pelas intervenções policiais, verifica-se que entre 2012 e 2022 o número de ocorrências deste tipo praticamente dobrou em nossa cidade, passando de 7 para 15 mortes, mas ainda assim representando uma das mais baixas taxas do Brasil. Da mesma forma, o número de policiais vimados como resultado de tais intervenções é o mais baixo do país, apenas 01 caso em 2022 e nenhum em 2021.

Alguns indicadores adicionais:

  • Pessoas desparecidas: aqui se registrou uma taxa de 83,3 por 100 mil habitantes, versus uma média nacional de 36,5, no ano base de 2022. Isso representa simplesmente a cifra mais elevada do país, colocando o DF em patamar bem próximo de estados como RO, RR, RS e AP.
  • Roubo e furto de celulares: DF também com um dos indicadores mais elevados do país, acima de 1000 por 100 mil habitantes, junto com o estado do AM, por exemplo, e bem acima do menor valor, que é o do RS, onde não passa de 160. A média nacional não chega à metade de tal cifra.
  • Estelionato por meio eletrônico: também nos perfilamos no topo do ranking, acima de 300 por 100 mil habitantes, tendo como companhias SC e ES, versus 189 como média do país.
  • Injúria racial e homofobia: em Brasília está, simplesmente, o índice mais alto do Brasil, 2,4 por 100 mil habitantes, versus 0,4 para o país como um todo.
  • Feminicídio: taxa de 1,3 por 100 mil, similar à média nacional, que é de 1,4. Os extremos são CE (0,6) e MS (2,9).
  • Roubo e furto de veículo: aqui estamos abaixo da média brasileira (261 x 324 por 100 mil) e os extremos são RJ (562) e GO (153).

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Na próxima semana retomarei a análise, com novos indicadores e comentários sobre o conjunto das informações trazidas pelo Anuário Brasileiro de Segurança Pública / 2023.

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Acesse aqui o documento original:   Anuário Brasileiro de Segurança Pública – Fórum Brasileiro de Segurança Pública (forumseguranca.org.br)  

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