A saúde e o “pobre de direita”

O conservadorismo no Brasil, apesar de um pequeno recuo em 2025, puxado por mulheres, idosos e gente baixa renda, continua mostrando forte presença.  É o que revela um levantamento da Ipsos-Ipec divulgado na última segunda-feira, 28 de julho, mostrando índices mais baixos de uma série histórica construída desde 2021. Foram ouvidos dois mil entrevistados em 131 municípios entre os dias 3 e 8 de julho, com margem de erro é de dois pontos percentuais. Contudo, apesar de tal decréscimo, metade da população ainda tem perfil considerado de alto conservadorismo, com apenas 8% das pessoas mostrando um perfil mais, digamos, progressista. As pautas são as tradicionais: defesa de prisão perpétua e outros tipos de apoio a pautas de segurança; rejeição do casamento homoafetivo; redução da maioridade penal; apoio à pena de morte; leniência em relação a à posse de armas de fogo. A legalização do aborto, por exemplo, segue com ampla rejeição: 75% dos brasileiros se dizem contra, enquanto apenas 16% apoiam a medida. Alguns segmentos sociais específicos se mostraram mais expressivos em tal redução do índice geral de conservadorismo, embora de forma discreta, foram eles: as mulheres, em geral; as pessoas com mais de 60 anos, curiosamente; as pessoas com ensino fundamental e com renda familiar até 01 salário mínimo; os moradores das regiões N e CO. Por outro lado, certos grupos ficaram ainda mais conservadores, como foi o caso de homens; moradores de capitais; renda acima de 05 salários mínimos; pessoas com curso superior. A pesquisa não entra em detalhes sobre a questão de como essas pessoas percebem e reagem frente aos problemas de saúde, de si mesmas ou da população, mas analisando a questão à luz da proverbial constatação do surgimento no Brasil da estranha figura do pobre de direita, seria possível estimar algumas possíveis consequências deste renitente conservadorismo do modo de ser brasileiro.

  1. A desconfiança no SUS e em toda ação pública e estatal no campo da saúde seria grande, em que pesem as evidências contrárias.
  2. A preferência por especialistas e atendimento direto em hospitais dominaria o cenário, sendo opções como a estratégia de saúde da família consideradas como um típico recurso “pobre e para pobres”.   
  3. A filiação a um plano de saúde seria um sonho de consumo, seja de sindicalistas ou da população em geral, sendo isso de preferência pago integralmente pelo governo ou pelos patrões.
  4. Os servidores públicos do próprio setor da saúde dariam preferência, diante de necessidades próprias ou de familiares, a recorrer aos hospitais privados e planos de saúde.
  5. As listas de medicamentos ora oferecidos no sistema público deveriam ser ampliadas, de forma a contemplar tudo o que as drogarias oferecem pelo país a fora, independente da aprovação formal da Anvisa.
  6. Deveriam ser oferecidas mais vagas nas faculdades de medicina, para que cada vez mais jovens pudessem realizar “o sonho de ajudar ao próximo”.
  7. As vacinas deveriam ser oferecidas apenas a quem acredite nelas ou as solicite especifica e formalmente, não devendo fazer parte de nenhuma obrigatoriedade, por exemplo, para filiação a programas sociais ou admissão na rede escolar.

Para inferir tais coisas, admito, não precisei fazer nenhuma pesquisa. Apenas me baseei em coisas que ouço na fila do supermercado, nas declarações de certos políticos, nos debates legislativos, em alguns artigos da imprensa, além de eventual contágio, digo contato, com as chamadas redes sociais. Sim, porque é preciso deixar claro que a pobreza direitista de que falo aqui não é, necessariamente, de natureza material, mas muitas vezes é apenas de espírito. Alguns desses “pobres” consomem uísque de 20 anos e passam suas férias, com as famílias, em Miami. Simples assim.

Isso é apenas um exercício de livre pensamento, ok? Mas nada impede que a realidade seja ainda pior…

***

Veja a matéria completa: https://g1.globo.com/politica/noticia/2025/07/28/ipsos-ipec-conservadorismo-brasil-2025.ghtml

Deixe um comentário