Depois de mais de 50 anos lendo e relendo este Livro dos Livros que é Grande Sertão: Veredas, de João Guimarães Rosa, ainda me ilumino, se não só com a forma e o estilo, mas também com a sabedoria que o texto entrega, por exemplo, a respeito de ser, estar e conviver no mundo; de ajudar a compreender as lições que isso nos traz; de saber ir atrás do quem das coisas; ou de fazer novas perguntas sobre a condição humana. Foi assim que me dei ao trabalho de nele procurar algo fundamental hoje e desde sempre, antes mesmo das leis mosaicas, representadas na figura acima, ou seja, os desafios da liderança nas organizações, desde entre a Jagunçaria até a NASA, passando pelos sistemas de saúde. A pergunta chave seria: o que faz, de fato, algumas experiências de gestão em saúde serem bem sucedidas, ao contrário de outras, que não chegam a alcançar tal status e desaparecem como por encanto? Qual o papel das lideranças nisso? Como pontos de partida, tomo algumas conclusões e desdobramentos desenvolvidos em minha tese de doutorado na ENSP/Fiocruz, na qual estudei a implementação do Programa Saúde da Família no Brasil.
Continue Lendo “Sobre Liderança (no Grande Sertão e alhures)”O Conselho Federal de Medicina e o Bolsonarismo
Meu amigo (há mais de 60 anos) Eduardo Guerra, também médico como eu e que já foi presidente do CRM-DF, sub Secretário de Saúde, além de outros cargos, preocupado com o andamento da escalada de ultradireita no movimento médico do país, inclusive em seu organismo principal, o Conselho Federal de Medicina, me manda um texto bastante elucidativo de sua autoria, sobre esta situação preocupante, não só para nós médicos como para a sociedade brasileira como um todo e a Democracia em geral, que prazerosamente reproduzo abaixo.
Considerações sobre as eleições para o CFM em 2024 – Vereda Saúde (veredasaude.com)
Continue Lendo “O Conselho Federal de Medicina e o Bolsonarismo”Reformas Leoninas na Saúde
Deu na imprensa local (ver link) que a vice-governadora do DF, Celina LEÃO anunciou medidas que segundo ela “vão minimizar o caos na saúde pública” em nossa cidade. Entre outras novidades declarou que representantes do Executivo realizarão reuniões com o Instituto de Gestão Estratégica de Saúde (Iges-DF), com o intuito de aumentar a capacitação dos profissionais de saúde e ampliar a oferta de médicos especialistas. Entre as estratégias discutidas está o fortalecimento das unidades básicas de saúde (UBS), entre outras medidas e também a “ampliação da mão de obra” nas mesmas. Afinal, diz a Sra. Leão, não só em tais unidades básicas, mas também em “outros locais”, são tratadas as “doenças cardiológicas e as doenças diabéticas”. Admite em todo caso que a prevenção e o atendimento inicial nas UBS são essenciais para evitar que os pacientes cheguem com complicações às Unidades de Pronto Atendimento (UPA), onde deverá ocorrer a devida “triagem”, além de “exames de rotina”. Vale comentar as expressões entre aspas, pelo menos.
[ATENÇÃO: A PARTIR DESTA DATA AS POSTAGENS DE “SAÚDE NO DF” SERÃO MENSAIS, SEMPRE NO PRIMEIRO SÁBADO DE CADA MÊS.]
Continue Lendo “Reformas Leoninas na Saúde”O sonho de Dom Bosco: o povo de rua no DF ainda procura pela tal fonte de “leite e mel”
A Codeplan-DF nos apresenta os resultados de uma pesquisa sobre o perfil da população em situação de rua em nossa cidade, que teve como objetivo quantificar e diagnosticar o perfil da população em tal situação no Distrito Federal, visando subsidiar proposições e políticas públicas alinhadas às necessidades dessa gente. Assim, foi realizada não só uma contagem das pessoas em situação de rua que estivessem no espaço das vias públicas, em serviços de acolhimento institucional e em comunidades terapêuticas, mas também a caracterização, por amostragem, do perfil de tais pessoas. Esta pesquisa vem suprir uma lacuna de 11 anos sem estudos de tal natureza, já que o último destes, realizados pela Universidade de Brasília, data de 2011. O fato é que nesta última década muita coisa mudou na cidade – e para pior – considerando que nos últimos dois anos e meio tivemos uma pandemia, na qual a necessidade de isolamento trouxe novos impactos para a população em situação de rua. Afinal, se a ordem geral é para ir para a casa, para onde iriam as pessoas que não dispõem de moradia? E é em tal cenário que a população que ocupa os espaços da rua saltou aos olhos de todos nós, mesmo daqueles que não estavam acostumados – ou de alguma forma se recusavam – a enxergá-la. As constatações mais simples de tal estudo são que a população em situação de rua é heterogênea, está em uma situação de pobreza e sem vínculo com uma moradia fixa. Contudo, o que o senso comum diz sobre tais pessoas nem sempre é preciso, mostrando a pesquisa, por exemplo, que tais pessoas, no geral, estão em situação de insegurança alimentar, querem sair da situação de rua e buscam um emprego para conseguir essa mudança. O leitor poderá acessar o texto completo do relatório no link abaixo, mas aqui vai uma síntese dos achados do mesmo, além de alguns comentários meus. Nada mais distante daquele sítio onde jorraria “leite e mel”, segundo o sonho atribuído a São João Bosco, ainda no século XIX e que faz parte do imaginário de Brasília desde os anos de sua fundação – sonho enganoso, como se vê. Na próxima semana vamos prosseguir com este assunto, até porque há divergências nas estatísticas sobre o total da população de rua em Brasília
Continue Lendo “O sonho de Dom Bosco: o povo de rua no DF ainda procura pela tal fonte de “leite e mel””Atenção à saúde no Brasil-real
Acabo de tomar conhecimento do lançamento, pela Fiocruz, do livro Atenção primária à saúde em municípios rurais remotos no Brasil, organizado e escrito por um grupo de pesquisadores desta e de outras instituições. Segundo o portfolio que recebi, tal obra busca compreender as particularidades dos contextos rurais remotos brasileiros em relação à organização e provisão da Atenção Primária à Saúde (APS), alinhada aos princípios basilares do SUS. Cada um de seus 14 capítulos trata de temas relacionados ao acesso e na organização da APS em diferentes cenários, e dificuldades correspondentes. A pesquisa no campo contou com apoio financeiro do Ministério da Saúde e da do Programa de Políticas Públicas e Modelos de Atenção e Gestão de Saúde da mesma Fiocruz, reacendendo assim luzes necessárias, depois da treva de seis anos que se abateu sobre o país. Diz ainda o texto anunciativo: a obra estimula a reflexão e instiga o interesse investigativo acerca de realidades tão singulares, pouco exploradas, por vezes invisibilizadas e não dimensionadas no financiamento, no planejamento e na execução de políticas públicas. Alvíssaras, portanto! Não li ainda e o farei logo que a obra estiver ao meu alcance. Sem querer ser pessimista, contudo, eu adicionaria uma ponta de sombras sobre os resultados, pois temo que o que seja encontrado no campo talvez esteja um tanto distante daquilo que um dia sonhamos para uma Atenção Primária que realmente faça jus a tal nome e honre suas origens. Se não, vejamos a seguir algumas questões que espero sejam respondidas (e de forma afirmativa) no referido trabalho, a cuja íntegra – repito – espero ter acesso em breve. Espero que a pesquisa não abranja apenas aquilo predefinido como “experiência avançada” ou “bem sucedida”, coisas que todos sabemos ser parte apenas de uma minoria dos casos, mas sim que nos traga uma visão de conjunto.
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