Assisti recentemente um filme que me marcou profundamente: A Short Stay in Switzerland (Uma Curta Estadia na Suíça), no Brasil Escolhas da Vida, uma produção britânica para TV, de 2009, dirigido por Simon Curtis e escrito por Frank McGuinness. A protagonista é a atriz Julie Walters, no papel da Dra. Anne Turner, tendo sido vencedora do prêmio Emmy por sua performance neste filme, sendo também indicada a diversos outros prêmios. É inspirado numa história real, tendo como tema o direito à morte assistida e digna, como acontece na Suíça, onde o procedimento é legal, inclusive para estrangeiros.
Continue Lendo “Quando a questão não está entre viver x morrer”Conhecimento “tradicional” e “verdade”
Em minhas caminhadas matinais pelo final da Asa Norte, em Brasília, vejo com alguma constância pequenas placas com informações sobre as espécies vegetais ali presentes, geralmente plantas naturais (ou endêmicas) do Cerrado, pois que existem algumas exóticas também. Fico feliz em vê-las (e aprender com elas), porque sou um notório curioso sobre a botânica e frequentemente, quando não me trai a memória, passo a incorporar esses novos conhecimentos, às vezes tratando os mesmos – confesso – como se os conhecesse desde sempre. Mas tem uma coisinha que às vezes me faz cócegas na mente, ou seja, a frequência com que aparece em tais plaquinhas a palavra “medicinal”, ao lado de designativos como ornamental, alimentícia, madeira. É apenas a primeira dessas categorias que me provoca especulações, porque quanto a ornamentar com flores, oferecer frutos e sementes, se converter em lenha ou tábuas, não caberiam muitas dúvidas. Mas tal definição de medicinal no mínimo exigiria a a indagação: como assim? Ou ainda: para que tipo de problemas de saúde? Nas tais plaquetas, é claro, isso não está esclarecido, mas quando vamos aos livros de botânica, principalmente dedicados às árvores e outras plantas do cerrado, o mesmo adjetivo aparece inúmeras vezes, com esclarecimentos um pouco mais detalhados, embora, a meu ver, ainda obscuros. Como diziam os antigos, é aí que a porca torce o rabo, ou para adequar tal expressão à situação presente, é aí que o pequizeiro retorce (ainda mais) seus galhos, já tortos de natureza. As informações obtidas em tais textos são de uma generalidade espantosa, dando origem a expressões vagas como afecções do fígado, estados inflamatórios, febres, corrimentos, doenças dos rins, do estômago, do fígado etc. Pois bem, gostaria de saber em que tipo de clínica ou laboratório, dentro de qual categoria metodológica, isso foi devidamente testado e comprovado. Os adeptos de tais terapias certamente vão me condenar por exagero na crítica e de descrença no poder terapêutico da natureza, ou coisas assim. Quem tive mais paciência vai tentar me explicar que se tratam de conhecimentos ancestrais de uma suposta medicina tradicional, aspectos aos quais eu deveria me render, deixando de lado minhas tendências céticas e materialistas. Com a aproximação da COP-30 já reparei que tal assunto ganhou novas proporções, por exemplo, na suposição de que certos “conhecimentos tradicionais” indígenas poderiam conter a chave não só para processos de cura de doenças como também para a resolução da crise ambiental. Isso é, sem dúvida, resultado de movimentos descoloniais e ambientalistas, que alimentam ideias um tanto românticas e sem base factual, de que as crenças e tradições dos chamados povos “ancestrais” ou “originários” apenas por isso já deveriam usufruir de um estatuto comparável ao das ciências estabelecidas, com raízes desde os tempos de Galileu, passando por Descartes, Louis Pasteur, Mme. Curie, Niels Bohr, Oppenheimer e Einstein. Mas a vida (aquela real, pelo menos) é bem mais complicada, para tristeza e revolta dos tais descolonizadores do conhecimento. Preocupado com isso procurei algumas leituras ancoradas na Ciência Tradicional, que os tais descolonizadores costumam menosprezar, em troca do que denominam Nova Ciência. Assim cheguei ao texto seguinte, que recomento aos leitores.
Negacionismo(s)
Imagino que esta seja uma palavra antiga na língua, mas que vem sendo usada com bastante frequência nos últimos anos. Sua aplicação mais usual refere-se à negação da existência da pandemia de Covid ou, pelo menos, recusa de enquadrar tal fenômeno dentro de uma lógica científica, se transformando em um quase sinônimo de bolsonarismo, em sua vertente, digamos, sanitário-cultural. Mas tal palavra espelha um conjunto muito mais amplo de situações, se estendendo também para fora do campo da saúde, dentro de um espectro que vai da ignorância pura e simples dos fatos à recusa em compreendê-los; da postura de avestruz em relação à realidade, à crença em realidades paralelas; das explicações fantasiosas dos fenômenos da vida ao crédito irrestrito às maluquices que vicejam nas redes sociais. Exemplos como o da terra plana, da crise climática ou da inocuidade ambiental da exploração do petróleo não faltam, ao contrário, abundam (palavra adequada…) em toda parte. Aliás, parece mais correto falar de negacionismos, assim no plural, pois as evidências mostram que quase sempre as negações da realidade se estendem a áreas diversas do conhecimento humano, como uma mancha de óleo (ou de esgoto) a se espalhar no oceano. O fato é que prospera no mundo atual o fenômeno traduzido por tal palavra, seja no singular ou no plural, já em vias de se transformar em uma mais uma marca essencial dessa nova era de pós-verdades, ilusões coletivas e manipulações do inconsciente coletivo de variadas naturezas, já antecipadas por Orwell em seu famoso 1984. Na área da saúde os efeitos perversos do negacionismo são evidentes e em muitos aspectos se fazem notar, como é o caso da queda acentuada das imunizações, verificada não só no Brasil como em outros países.
Continue Lendo “Negacionismo(s)”É a Vida é a Vida e é a Vida! E ela se completa com a Morte
Saudoso Gonzaguinha! Temos direito à vida, por certo, mas há uma diferença profunda entre direito e dever quanto a tal quesito e assim o que defendo é o primeiro termo. No meu caso, o que eu desejo é usufruir, acima de tudo, do direito de ser o único protagonista de minha vida, especialmente nas decisões sobre os cuidados de saúde que eu esteja disposto a receber, principalmente aqueles que me serão destinados na etapa final de minha vida. A gente deve ter, acima de tudo, o direito de viver, mas não (jamais, nunca, never!) o dever de continuar vivo contra a própria vontade. Cabe a cada pessoa, afinal de contas, desenvolver e exercer a percepção de sentido que a vida deve ter e rejeitá-la quando isso escapar de sua concepção de bem vivê-la. Aos 77 anos de idade, como acabei de completar, refletir sobre isso se torna coisa essencial. E numa contradição apenas aparente, defender o direito à vida implica, diretamente, em refletir sobre o direito à morte, a qual, aliás, nunca é demais lembrar, também faz parte da vida. Estou com Woody Allen, quando ele diz que pensar muito na morte é esperar que a recíproca não seja verdadeira. Eu também tenho pensado muito nela, mas o que defendo é a necessidade de que nós ponhamos mais atenção sobre esta etapa da vida. – Nós, quem, cara pálida, de quem você fala? Falo de todo mundo, desde os cidadãos comuns como eu e você; os políticos, os juristas, os líderes religiosos, os agentes da cultura, os professores e por aí a fora. Sim, meus amigos, não é preciso amar a morte ou desejá-la, mas sim conversar cada vez mais sobre ela, sem preconceitos, sem ideias pré-concebidas, sem medo. Como etapa mais do que natural da existência, além de única, a morte, deve ser “vivida” de acordo com as aspirações e crenças, com a liberdade e a autonomia que as pessoas devem ter. O morrer, mais do que simples destino, deve ser considerado direito humano fundamental, a ser experimentado com dignidade. Enfim, que ninguém seja constrangido a continuar vivo sendo portador do que considera um grau insuportável de sofrimento. Não falo de suicídio, uma questão de saúde pública, objeto de ações específicas da esfera pública, falo de uma boa morte, dentro de limites restritos à decisão individual e de cujo cortejo devem fazer parte a autonomia, a autodeterminação, a dignidade e, no limite, a morte voluntária e assistida. E isso deve incluir: a recusa terapêutica; o direito aos cuidados paliativos, ao invés das “heroicas” experimentações terapêuticas; as funestas iniciativas que porventura venham apenas a prolongar o processo de morrer; e, finalmente, a morte assistida.
Com essas preocupações na cabeça encontrei na internet uma entidade civil, chamada Eu decido: pelo direito de morrer com dignidade, cujo link compartilho com vocês. Apareçam por lá. Vamos discutir o assunto aqui. Eu já me associei.
Acesse: EU DECIDO – Pelo direito de morrer com dignidade
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Aproveito para compartilhar dois textos meus sobre tal assunto.
O declínio do Império Norte-Americano (também na Saúde)
Enquanto Trump vai lançando seus perdigotos grosseiros, mal intencionados ou mentirosos sobre o Brasil e outros países, o mundo gira e revela que cada vez mais a potência mundial de outrora, embora ainda mantenha parte de seu poderio, a graças ao arsenal militar e de outros recursos que ainda possui, vai caminhando em direção ao abismo, tanto simbólico como material. Já ninguém duvida disso, principalmente porque os EUA já perderam quase totalmente sua aura, construída de forma questionável, aliás, de serem paladinos e grandes defensores da democracia no mundo. Neste campo, em comparação com o Brasil, por exemplo, a ciência política independente tem demonstrado que nossos mecanismos de proteção da democracia real foram muito mais eficientes do que os deles, rebaixados que foram por Trump ao estatuto de uma república bananera. O nosso oito de janeiro, embora sem afastar todos os riscos, foi resolvido de maneira muito mais certeira do que o seis de janeiro deles. Se podemos orgulhar da nossa Democracia, o mesmo se pode dizer a respeito do nosso Sistema de Saúde, o SUS, embora este não seja devidamente compreendido por parte da população – até porque ainda precise ser aprimorado, e muito. Mas em comparação com o deles, o nosso SUS ganha disparado…
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