Mais médicos, mais do mesmo?

Após desqualificar ideológica e tecnicamente os profissionais cubanos que trabalhavam no Brasil através do Programa Mais Médicos, levando à ruptura unilateral da cooperação técnica, o desgoverno Bolsonaro se deu conta da estupidez de tal medida e agora procura um jeito de consertar mais este seu mal feito. Assim, o Ministério da Saúde admite que existem mais de seis milhões de pessoas a descoberto em matéria de saúde no Brasil, em quase oitocentos municípios com altos índices de vulnerabilidade, e que elas deverão ter de volta sua assistência médica em Atenção Primária. É claro que não se fala em reparar a perda de quase um ano na assistência dessas pessoas. Desta vez, se vai priorizar a participação de médicos formados e habilitados, com registro em qualquer CRM do Brasil, bem como eventuais titulações de especialistas ou portadores residência médica em Medicina da Família e Comunidade. E aos cubanos, antes demonizados pelo ativismo ideológico bolsonarista, poderão finalmente entrar com pedido de autorização para morar no Brasil por dois anos, tempo que pode ser estendido de forma indeterminada, de forma a “atender ao interesse da política migratória nacional”, conforme ato assinado pelos notórios Sérgio Moro e Ernesto Araújo. Mas não para trabalhar como médicos, embora isso tivesse sido também cogitado. Continue Lendo “Mais médicos, mais do mesmo?”

Por uma Atenção Primária à Saúde forte no Distrito Federal!

A prestigiada revista Ciência & Saúde Coletiva, publicada pela ABRASCO, nos brindou com um número especial sobre nosso tema predileto, ou seja, a Saúde no DF, com reflexões e diferentes pontos de vista sobre os avanços, limites e desafios enfrentados pelo setor saúde em nossa cidade. Tal publicação foi organizada em três eixos, agrupados por áreas temáticas importantes para a consolidação do SUS, a saber: 1. gestão, regionalização, planejamento e avaliação; 2. atenção à saúde: construções, avanços e desafios; 3. formação profissional. Seus autores são pessoas convidadas de diversas instituições brasileiras e estrangeiras, além de a(u)tores dos próprios serviços de saúde. Assim, nas palavras dos elaboradores do artigo de apresentação (Gerson Penna, Daniel Soranz, José Agenor Alvares e  Luiz Felipe Pinto) “trabalhou-se evitando a endogenia, selecionando 100 autores de cerca de 20 instituições da comunidade científica, das escolas locais, dos serviços de saúde. O resultado está expresso em 25 artigos científicos agora entregues à literatura científica nacional e internacional”.  Veja abaixo a lista de artigos. Continue Lendo “Por uma Atenção Primária à Saúde forte no Distrito Federal!”

Mais fácil um boi voar: Max Weber e a Gestão da Saúde no DF

Nestes estranhos tempos (para dizer pouco), em que as ciências, particularmente as humanas, são desprezadas, não deixa de ser surpreendente alguém recorrer aos ensinamentos da Sociologia para explicar qualquer coisa, como vou tentar agora. Faço isso após ter lido na imprensa que a SES- DF cuida de que servidores cedidos ao Instituto de Gestão Estratégica de Saúde (IGES-DF), se manifestem sua opção pela remoção a outras unidades ou permanência no local de origem.  Parece coisa banal e rotineira – e aliás deveria ser – mas tem sido, por aqui, objeto de incômodo e apelo a prerrogativas e conveniências corporativas, devidamente apoiadas, amplificadas e dramatizadas pelos sindicatos das diversas categorias. É aí que entra Max Weber, considerado um dos pais da Sociologia, que produziu sua obra no último quartel do século XIX, sendo contemporâneo de Marx, portanto. Continue Lendo “Mais fácil um boi voar: Max Weber e a Gestão da Saúde no DF”

A Democracia faz bem à Saúde?

Acabo de ter acesso a um artigo da revista The Lancet (ver link ao final) no qual os autores indagam se este negócio de democracia é realmente bom para a saúde pública. Assim, recorrendo a estimativas de mortalidade por causas específicas e expectativa de vida livre de HIV, além de dados da carga global de ferimentos e fatores de risco, relativos a 2016  e cotejando tudo isso com informações sobre o tipo de regime em uma série de 170 países, foi analisada a associação entre a democratização e a saúde da população , no período de 1980 a 2016. Isso permitiu descobrir que a expectativa de vida adulta livre de HIV melhorou mais rapidamente nos países em desenvolvimento que fizeram a transição para a democracia no último meio século. E mais: que a qualidade da vida democrática, particularmente definida como ocorrência de eleições livres e justas, seria responsável por 22% da variação positiva nas doenças cardiovasculares, 18% nas lesões de trânsito, 17% na tuberculose, 10% no câncer, com frações menores para outras doenças, principalmente não transmissíveis. Isso parece ser mais influente do que próprio PIB, que seria responsável por apenas 11% da variação nas doenças cardiovasculares e 6% no câncer, por exemplo. A “qualidade da democracia” não parece estar associada a aumentos no PIB per capita, mas sim a declínios na mortalidade por doenças cardiovasculares e aumentos nos gastos públicos em saúde. Continue Lendo “A Democracia faz bem à Saúde?”

O Banco Mundial e a reforma do SUS

Os defensores mais ortodoxos do SUS, (leia-se, politicamente à esquerda) estão alarmados com dois eventos recentes, nestes primeiros dias de abril de 2019. O primeiro foi uma reunião da Comissão de Seguridade Social e Família da Câmara do Deputados, em que se ouviu o economista do Banco Mundial, Edson Araújo, para discutir propostas de mudanças no SUS, nos termos daquilo que é justamente o segundo motivo de alarme para tal grupo: um relatório da referida instituição, no qual tais mudanças são colocadas de forma incisiva e urgente. Tais recomendações já haviam orientado alguns dos programas de candidatos à presidência em 2018 e seu objetivo, ao que parece, era justamente este. Como geralmente acontece entre os militantes do SUS, a simples menção a organismos internacionais, como o Banco Mundial ou a OMS, ainda mais se estão em foco suas propostas para o Brasil, provoca abalos tectônicos de altíssimo grau. Do outro lado, do Governo, por exemplo, a tendência é minimizadora. Poderíamos até mesmo dizer que se desenvolve um choque entre o “mi-mi-mi” e o “mi-ni-mi”, no qual a verdade costuma ficar debaixo de escombros… Vamos analisar o panorama nas linhas seguintes. Continue Lendo “O Banco Mundial e a reforma do SUS”