Ainda não li os jornais de hoje, nem assisti a TV, mas posso apostar em que algumas notícias com certeza estarão lá. Por exemplo, sobre as longas filas matinais na porta de serviços de emergência ou outros tipos de serviços de saúde; usuários revoltados ameaçando quebra-quebra; intervenção policial ou da segurança para acalmar os ânimos; agentes políticos tentando tirar proveito da situação e outros tantos dizendo que está tudo “normal” (no que, aliás, devem ter razão, quanto a esta estranha “normalidade”). Isso, é bem verdade, não apenas aqui no DF como em muitas partes do Brasil, onde tais fatos já fazem “parte da paisagem”. São coisas que não refletem apenas o estado de desorganização e precariedade dos serviços de saúde em geral, mas tem foco mais sensível nas costumeiras restrições às internações hospitalares. Questão fundamental, sem querer simplificar demais a problemática: toda gente que está naquelas filas deveria ou precisaria estar ali? Um raciocínio simples: há quem precise de atendimento “aqui e agora”; outros são para “agora”, mas não “aqui”; há os que são para “aqui”, mas que podem esperar; ou seja, “não agora”., além da turma do “não aqui e nem agora”. Por incrível que pareça, em boa parte dos serviços de saúde, aqui e alhures, a regulação dessas filas (e a solução adequada a cada uma de tais situações) cabe a um utensílio inventado há muitos séculos: o relógio. Para superar isso há ideias no cenário, resumidamente: (a) acolhimento e (b) utilização das classificações de risco através de protocolos padronizados. Coisas simples, mas geralmente ignoradas ou tratadas com superficialidade nos serviços de saúde, particularmente na modalidade dominante aqui em nossa cidade. Em tudo isso a enfermagem tem um papel especial, ao defender os pacientes da dispensa, devolução ou encaminhamento antes que recebam atendimento ou pelo menos alguma forma de orientação. Coisas assim certamente terão seus adversários. Os pacientes, por exemplo, podem ter outras expectativas, de serem rapidamente atendidos e recebam logo seus pedidos de encaminhamento, exame ou receita, reagindo negativamente a um eventual “não agora”. Os médicos normalmente repudiam tentativas de racionalização, de qualquer natureza, por razões ideológicas que têm mais a ver com seu conforto no trabalho mais do que o de seus pacientes. Assim o papel da enfermagem é essencial, e deve ser de liderança, existindo uma tendência mundial no sentido de que a enfermagem desempenhe um papel crítico no aperfeiçoamento da porta de entrada dos sistemas de saúde, com práticas já consagradas em países com bons sistemas de saúde. Uma coisa é certa: para distúrbios de tal natureza, que afetam profundamente o bem estar e os direitos da população, medidas paliativas não cabem, da mesma forma que soluções intempestivas do tipo cortar cabeças ou restringir o direito da população aos serviços de saúde, coisas que só provocam mais dor e sofrimento, além de afastar cada vez mais uma solução definitiva para tais problemas.
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A notícia é do dia 10 de junho de 2019, mas poderia ser de janeiro, fevereiro, março etc. De qualquer ano; de uma década atrás ou do século passado: tanto faz. O Correio Braziliense informa que a SES-DF está fazendo restrições ao atendimento em hospitais públicos, “sem data para acabar”. Excluem-se da restrição “quem não corre risco de morte”, mas sabe-se lá quais serão os critérios para determinar isso. Em todo caso, a Secretaria orienta os pacientes a procurarem unidades básicas de saúde, sobre cujo funcionamento também pairam dúvidas: seu número é suficiente? Estariam abertas nas noites e finais de semana? Suas equipes estão capacitadas e seu equipamento completo? Não iriam, por sua vez, encaminhar os demandantes de volta para os hospitais? Diz ainda a notícia que ao menos seis hospitais, nos últimos dias, dispensaram pacientes com quadro de saúde considerado menos grave, mais uma vez sem definir exatamente o que é isso. É bom não esquecer que uma simples dor no peito pode ser um infarto grave em estágio inicial, que só pode ser confirmado após observação e exames. Tal procedimento, segundo o explicitado em nota oficial da SES-DF, visaria atender todos aqueles com risco de morte, “para não repetir casos recentes”. Aplica-se aí uma espécie de “Lei de Paulo Guedes”, semelhante àquela que tentam aplicar às aposentadorias, ou seja, deixar para agir quando a morte estiver próxima. Na mesma matéria se lê que, em cinco meses de governo Ibaneis Rocha, foram exonerados cinco diretores de hospitais públicos, por motivo de “não apresentarem resultados”. Parece uma solução do tipo cortar a cabeça (ou outra parte do corpo) que esteja apresentando problemas. Ou de consertar o vazamento da torneira reparando o tampão da pia. Teriam jeito coisas assim? Já me detive sobre tal assunto, ou seja, da organização precária da rede pública no DF por diversas vezes aqui no blog (ver links ao final). Mas como o assunto não se esgota, entra governo sai governo, sou obrigado e retomar colocações anteriores, que continuam e continuarão valendo, sabe-se lá até quando. Continue Lendo “Resolvendo a crise hospitalar no DF pelo método do Dr. Guillotin”
Bastam algumas horas à beira de um leito…
Cláudia Collucci, repórter especializada na área da saúde, jornalista séria cujas matérias acompanho há tempos, nos revela na FSP de 22 de maior de 2018 que a cada três minutos, mais de dois brasileiros morrem em hospitais por evento adverso. Ela nos relata o drama que viveu ao acompanhar seu pai, internado em um hospital de Ribeirão Preto, SP, presenciando uma série de falhas de procedimentos nos três dias em que ali ficou “internada” como acompanhante. Fico imaginando o quanto o mesmo que a jornalista presenciou acontece, não só em Ribeirão Preto, mas também no Rio, São Paulo, Brasília, em toda parte do Brasil e do mundo, enfim, todo dia, toda hora… Há soluções? Claro! Mas como disse Collucci: “bastam algumas horas na beira do leito para perceber que ainda há uma enorme distância entre a teoria e a prática”. Continue Lendo “Bastam algumas horas à beira de um leito…”
