Primeiro caso: Dona Rosinha é uma senhora idosa que mora na Vila Alvorada, na periferia de uma cidade grande. Ela sempre teve muitas dificuldades em conseguir consultas com médicos, sendo que sofre de hipertensão, varizes e relativo sobrepeso. Recentemente, contudo, foi aberta em seu bairro uma Unidade Básica de Saúde da Família, com equipe completa e tudo que manda o figurino. Dona Rosinha já esteve na unidade diversas vezes, já tendo sido aberto seu prontuário e designada a equipe que lhe acompanhará. Indagada pela Agente Comunitária se estava apreciando o novo atendimento, disse que não muito, pois eles estavam ispiculando muito da vida dela e que além do mais as consultas eram muito demoradas, o que a deixava fatigada. Segundo caso: Jorge é um jovem médico recém saído de uma residência em Clínica Médica. Ele trabalha em um Centro de Saúde de periferia e sente-se perfeitamente à vontade com suas atividades, pois está ali por escolha própria, foi admitido por concurso e gosta daquela rotina de atender pessoas diversas, com queixas também muito diversificadas, obrigando-o muitas vezes a estudar e se aprofundar com os problemas que lhe são trazidos. A Secretaria de Saúde acaba de fazer um inquérito sobre a qualidade dos serviços prestados em sua rede e Jorge ficou bastante decepcionado com sua avaliação, pois entre elogios superficiais, alguns pacientes se queixaram de que ele receita poucos remédios e reluta em encaminhar pacientes aos especialistas fora dali, mesmo quando os pacientes lhe explicitam tal desejo. Terceiro caso: Dr. Benevides é endocrinologista e divide seu tempo entre um consultório particular com boa clientela e o atendimento em unidade especializada pública. É conhecido por receitar remédios caros, pois acredita que o custo de um medicamento não é um problema de médicos, mas sim de governos e que além do mais sua obrigação é sempre oferecer o melhor a seus pacientes. Gosta do que faz, mas se mostra especialmente contrariado em relação aos médicos da rede básica, um Dr. Jorge em particular, que em interações ocasionais insiste em defender que os pacientes de diabetes devem ser tratados na Unidade de Saúde da Família e não encaminhados ao especialista, o que tem prejudicado a pesquisa de um novo medicamento hipoglicemiante que Benevides executa a pedido de um laboratório farmacêutico.
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Leio nos jornais a notícia que já parece fazer parte da paisagem: um homem com uma faca enterrada no tórax teve que esperar quase 48 horas para ser operado em um dos hospitais do DF. Hospital público, no caso, mas poderia ser também privado. Coisas assim não são exclusivas do SUS. Se procurarmos bem, é possível encontrar um feixe de monstruosidades deste tipo também nos hospitais com nome de santa que existem por ai. Mas o certo é que ninguém fala das inúmeras vidas que são salvas diariamente – e não são poucas! – nos hospitais do DF, tanto públicos como privados. Algo assim se aplica também, segundo pesquisas recentes, à divulgação de fake news maliciosas (existiria uma variedade “do bem”?), capazes de circular mais rápida e eficazmente do que as notícias realmente verdadeiras de utilidade pública. Assim funciona a humanidade. Mas é preciso prestar atenção nos contextos. Por exemplo, naquele cartaz habitual na entrada nos serviços de saúde que ameaça “maltratar funcionário público é crime”. Essa turma é realmente “maltratada”? Com frequência? Acredito que sim, mas não vejo preocupação idêntica e recíproca quando a questão é “maltratar usuários”, que também é um evento frequente. Internamente, nos serviços de saúde, há uma história contumaz: o mandatário culpa o subordinado e o subordinado dirige a culpa para mais abaixo, de tal forma que a culpa de tudo o que acontece de ruim na repartição corre o risco de vir a ser da moça do cafezinho. Enquanto isso todos culpam o governo – qualquer governo – e da mesma forma os governos culpam os cidadãos (“por que raios foram votar na gente?”) ou então a “herança maldita” que receberam. Uma coisa é certa: ninguém se assume diretamente culpado. Aquela história de ministros se suicidando de vergonha em frente a câmeras de TV só acontece mesmo entre os japoneses, eita povo bárbaro! É cultural, eu diria… Mas afinal, que cultura é essa? Continue Lendo “Cultura organizacional e saúde”
No DF: controle da dengue e cultura organizacional
Leio nos jornais locais que o funcionário da SES-DF responsável pelo controle da dengue, ou pelo menos pelas operações de “fumacê” foi destituído de suas funções, aparentemente devido aos maus resultados obtidos com seu trabalho. Dias antes foi a vez da diretora do Hospital de Sobradinho, sobre a qual a gentil manifestação do Governador foi, textualmente “ou ela sai ou cai o secretário”. Como se vê, aquele interessante estilo “deixa que eu chuto”, do qual tem ser observado presença marcante no Palácio do Planalto, já subiu o Eixo Monumental e alcançou, gloriosamente, também o Buriti, pouco mais de um km acima. Trata-se de uma história de longo curso na nessa curiosa civilização subequatorial que é o nosso país: o mandatário culpa o subordinado e o subordinado dirige a culpa para mais abaixo, de tal forma que a culpa de tudo o que acontece de ruim na repartição possa vir a ser da moça do cafezinho. Ah! Enquanto isso todos culpam o governo – qualquer governo – e da mesma forma os governos culpam os cidadãos (“por que raios foram votar na gente?”). Uma coisa é certa: ninguém se assume diretamente culpado. Aquela história de ministros se suicidando de vergonha em frente a câmeras de TV só acontece entre os japoneses mesmo, aquele povo bárbaro! Continue Lendo “No DF: controle da dengue e cultura organizacional”
