Armínio Fraga, ex-Presidente do Banco Central no governo FHC e figura carimbada do mercado financeiro, quem diria(!), virou uma referência importante na discussão sobre os rumos do sistema de saúde no Brasil. Os puristas ideológicos odeiam tal coisa, mas de minha parte devo admitir que está valendo a apena ouvi-lo, mesmo sem concordar cem por cento com o que ele ainda dizendo. Em entrevista recente à FSP, assinada pela jornalista especializada em questões de saúde, Claudia Collucci (ver link ao final), ele simplesmente defende que o país caminhe para um sistema de saúde que seja mais um híbrido de alguns modelos europeus, com gestão de serviços terceirizada, não mais algo derivado daquele generoso sonho constitucional de 1988. Nas palavras dele: “Não acredito que seja possível voltar ao modelo original do SUS. Acho que seria mais fácil caminhar para um modelo que seja mais um híbrido de alguns modelos europeus.” De toda forma eu, Flavio Goulart, acredito que não devemos dar ao SUS um estatuto de causa finita, um sistema triunfante, perfeito e acabado. Ao contrário, sua viabilidade dependerá da possibilidade de seu aperfeiçoamento constante, mesmo que a custa da derrubada de alguns mitos e certezas sobre o mesmo (o que a militância naturalmente também repudia). Neste aspecto penso que as ideias de Armínio Fraga devem ser consideradas e somadas a outras, de extração diversa.
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[O post de hoje tem a participação de nossa parceira Henriqueta Camarotti!]
Deu na imprensa que um estudo da USP projeta que, até 2025, o Brasil terá 3 médicos para cada grupo de 1.000 habitantes, ultrapassando países como EUA, Japão e China. Tal estimativa já leva em conta a abertura novos cursos de medicina no país, além de ajustes populacionais do censo do IBGE. Atualmente, existem no país 2,91 médicos por 1.000 habitantes totalizando quase 600 mil profissionais. Mas isso é apenas uma informação numérica. Há diversas considerações a fazer para responder à pergunta acima. Quanto ao DF, o nosso quociente de médicos por habitante é simplesmente o maior do Brasil entre os estados, chegando a 5,5. Se a comparação for com as capitais há algumas com números maiores, como é o caso de Vitória com quase 15 médicos por mil habitantes, mas isso pode ser o resultado de parte desses profissionais morarem na capital, mas trabalharem em cidades vizinhas, o que parece ser comum. Seria este número é bom ou ruim, necessário ou desnecessário, adequado ou não à política de saúde definida nas Leis e normas relativas ao SUS? Para avançar há mais perguntas a serem respondidas: quantos e quais médicos estão disponíveis no Brasil para atuar no sistema de saúde? E quantos serão nos próximos anos? O que mudou na formação e no trabalho médico no país? A maior oferta de profissionais na última década responde às demandas do SUS? Idem para as regiões desassistidas e as necessidades de saúde da população? O modelo assistencial praticado tem a ver com a demanda por mais e mais médicos?
Continue Lendo “Proporção de médicos por habitantes no Brasil (e no DF) já quase equivale a de países desenvolvidos: isso é bom?”Vai bem a nossa Saúde?
Pesquisas de opinião sobre qualquer assunto são importantes, mas devem ser analisadas em função do contexto em que são produzidas, além de questões de método, claro. A recente experiência brasileira com o bolsonarismo – que Los Hermanos Transplatinos acharam por bem reproduzir agora – mostrou um lado obscuro e até mesmo malévolo na interpretação de tais enquetes. De fato, é demasiadamente humano buscar em qualquer fato da vida uma explicação que atenda nossas crenças e interesses, mas a maneira como isso foi feito pelo Gabinete do Ódio instalado no Palácio do Planalto ultrapassou todas as fronteiras da intencionalidade enviesada e da desonestidade. Mas como aqui é um blog honesto, vamos comentar a recentíssima pesquisa sobre a atuação do governo federal na Saúde e outras áreas realizada pelo DataFolha. Não sou daqueles que acham que Datafolha e FSP façam parte de um tipo especial de gabinete do ódio e da mentira, um componente das forças golpistas. Mas também não o exato contrário disso. Para falar a verdade, confio mais na Folha do que em muitos sites que mal e mal disfarçam sua condição de porta-vozes extra oficiais do Governo, dos quais me abstenho de citar nomes. Sem impedimento de que também a FSP tenha seus interesses particulares, que nem sempre são os mesmos da maioria da população ou dos setores menos bem aquinhoados. Mas vamos aos resultados da tal pesquisa, com os comentários devidos.
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Escutei por esses dias na CBN o comentarista Ricardo Henriques (ver link ao final) falando sobre questões da liderança na Educação, especificamente sobre o importante papel dos diretores de escola no processo educativo. Há estudos mostrando que mesmo que os dirigentes não participem diretamente das atividades em sala de aula, as qualidades da gestão que praticam influenciam direta e positivamente nos indicadores escolares. Sempre achei que isso também se aplica perfeitamente ao caso da saúde e inclusive já escrevi aqui sobre isso. Tenho ainda presente na memória a importância que uma certa Dona Cecília teve em minha vida, diretora que era do Grupo Escolar Francisco Salles, em BH, onde conclui o que se chamava na época de curso primário. A comparação com a escola vizinha, Caetano Azeredo, era forçosa. De um lado reinava a ordem, do outro a esculhambação, com consequências previsíveis na vida de alunos e professores. O fato é que desde então me pergunto: o que faz as coisas serem assim tão diferentes em duas instituições públicas, situadas no mesmo bairro, destinadas à mesma classe média, com professores percebendo os mesmos salários? Henriques aponta uma série de fatores para explicar tais coisas , entre elas, a democratização do ambiente, a participação da comunidade, a capacitação dos diretores para as funções de gestão, a despolitização dos processos de escolha, entre outras. Mas acho que posso acrescentar alguma coisa, com aplicação direta ao campo da saúde, que é afinal aquele sobre o qual posso dizer que entendo alguma coisa.
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Prossigo hoje na apresentação iniciada na última semana de alguns dados do Boletim IEPS – Data, publicado pelo Instituto de Estudos para Políticas de Saúde (IEPS) de São Paulo, sobre a evolução dos principais indicadores de mortalidade e morbidade em municípios e estados brasileiros. Hoje é feita a comparação entre os dados da Capital Federal, cotejados com outras capitais brasileiras, selecionadas por representação regional e população. Veja a tabela a seguir, com comentários mais adiante.
| INDICADOR | BRASÍLIA | GOIANIA | B. H. | BELEM | FORTAL. | CTBA |
| EXPECTATIVA DE VIDA (anos) | 77,4 | 75,3 | 76,4 | 74,3 | 74,4 | 76,3 |
| POPULAÇÃO > 60 ANOS (%) | 7,9 | 9,5 | 13,2 | 9,3 | 9 | 11,8 |
| SANEAMENTO BÁSICO (%) | 99,0 | 74,6 | 94,1 | 66,2 | 72,1 | 94 |
| MORTALIDADE CAUSAS EVITÁVEIS (por 100 mil hab) | 66,6 | 86,1 | 68,1 | 106,3 | 79,4 | 59,0 |
| INTERNAÇÕES CSAP (por 100 mil hab) | 763,4 | 513,6 | 748,5 | 663,3 | 714,2 | 718,4 |
| COBERTURA ATENÇÃO BÁSICA (%) | 63,2 | 62,7 | 100 | 48,5 | 60,3 | 63,3 |
| COBERTURA VACINAÇÃO POLIO (%) | 73,2 | 72,6 | 67,9 | 50,8 | 73,2 | 79,0 |
| % NASCIDOS VIVOS PRENATAL OK (%) | 71,6 | 74,6 | 84,3 | 56,1 | 65,4 | 86,7 |
| MÉDICOS (por 01 mil hab) | 3,92 | 4,27 | 5,97 | 2,3 | 3,19 | 3,54 |
| ENFERMEIROS (por mil hab) | 2,53 | 1,88 | 2,55 | 1,24 | 2,16 | 1,67 |
| LEITOS SUS (por 100 mil hab) | 167,63 | 247,31 | 204,84 | 181,56 | 219,6 | 151,75 |
| LEITOS NÃO SUS (por 100 mil hab) | 151,12 | 231,86 | 139,55 | 101,84 | 131,94 | 89.69 |
| DESPESAS SAÚDE / hab (R$) | – | 1161, | 2110, | 752, | 970, | 1343, |
| DESPESAS REC PRÓPRIOS / hab (R$) | – | 532, | 672, | 384, | 488, | 605, |
