Tudo que vem do atual governo federal merece um pé atrás? Sem dúvida, é melhor ser cauteloso, pois o prontuário bolsonarista de sandices, em todas as áreas e não apenas na saúde, parece ser inesgotável. Mas mesmo assim é bom analisar cada proposta, por exemplo esta, do Ministério da Saúde, que abriu consulta pública para definir um padrão de serviços essenciais que deve ser ofertado à população em todas as Unidades de Saúde da Família, intitulada “Carteira de Serviços da Atenção Primária à Saúde Brasileira”. Como ponto de partida, instrumento semelhante em uso em seis capitais brasileiras – Rio de Janeiro, Florianópolis, Curitiba, Porto Alegre, Belo Horizonte e Natal, além da Espanha. Segundo o secretário de Atenção Primária à Saúde do MS, Erno Harzheim, que é sem dúvida um técnico portador de um “bom prontuário”, nas questões de saúde, “a definição deste conjunto essencial de serviços traz transparência, além de ser uma potente ferramenta para que as pessoas possam fiscalizar, avaliar e qualificar a Atenção Primária Brasileira”. Minha tendência é de concordar com ele, mas esta não parece ser a opinião de algumas pessoas da área, ligadas a corporações profissionais (os médicos ainda não se manifestaram) e, principalmente, à academia, nominalmente à Escola Nacional de Saúde Pública da FIOCRUZ, onde subsiste, como se sabe, uma tradição de “desconstrução” de políticas oficiais, dentro de uma lógica, às vezes, francamente conspiratória. Vamos analisar o caso com mais detalhe… Continue Lendo “A tal “Carteira de Serviços” proposta pelo Ministério da Saúde representa um risco real para a atenção à saúde no Brasil?”
Práticas alternativas, integrativas, complementares e não custa indagar: também efetivas?
Anuncia a SES-DF (ver link ao final) a comemoração dos 30 anos de um programa denominado “Farmácia Viva”, que associa a fitoterapia como opção adicional aos procedimentos terapêuticos já disponíveis na rede local de serviços públicos de saúde. Segundo a SES-DF, os medicamentos naturais de tal “Farmácia Viva” já beneficiaram mais de 300 mil pacientes. As plantas utilizadas são cultivadas em uma das unidades do sistema, no Riacho Fundo I, onde ocorrem os processos de plantio, colheita, triagem, secagem e extração química, após o que podem os produtos serem utilizados em forma acabada ou como matéria-prima para a produção de outros remédios. As ofertas atuais são de babosa, boldo, confrei, funcho, alecrim pimenta, guaco e erva baleeira, estando em testes uma nova planta, com suposto efeito nos estados de ansiedade, denominada “colônia”. Assim, duas dezenas de unidades de saúde, inclusive um hospital, já recebem esses medicamentos, que em 2018 chegaram a 25 mil unidades produzidas e distribuídas. Para retirar os remédios, é necessário receita de médico, enfermeiro, fisioterapeuta ou nutricionista – menos mal. Visto assim, de forma singela e até ufanista, parece ser uma solução ideal. Mas, como tudo na vida, as coisas são muito mais complexas e controversas do que transparece no discurso oficial. Continue Lendo “Práticas alternativas, integrativas, complementares e não custa indagar: também efetivas?”
SUS: quem defende não usa, quem usa não defende…
O professor da Faculdade de Medicina da USP, Mario Scheffer, que junto com Ligia Bahia (da UFRJ) atualmente empalma a defesa dos princípios da Reforma Sanitária, deixando pessoal da UERJ e da FIOCRUZ meio perdidos nas malhas de um discurso identitário radical e pouco sintonizado com a realidade do sistema de saúde, analisa o momento atual dos planos de saúde no Brasil (ver links ao final), como já o fez em relação aos dilemas da distribuição de médicos no Brasil. Ele lamenta, entre outras coisas, que muitos dos sanitaristas brasileiros (entre os quais estamos incluímos ele e eu) usam pouco o SUS, para si e familiares, dando preferência aos planos privados, apesar de experiências ruins com estes últimos. Realmente penso que é a pura verdade. Não acredito, todavia, que isso possa ser um fator importante na atual derrocada do SUS, se não do sistema em si, mas das ideias que o sustentam. Mal comparando, talvez, é como se uma pessoa que se delicia com doces não pudesse defender o direito de diabéticos receberem insulina nas farmácias públicas; ou se um a abstêmio não conviesse concordar com os riscos do uso do álcool e demais drogas e defender políticas para tal problema. A meu ver, o buraco é (bem) mais embaixo. Ou alhures. Nas linhas seguintes exponho meu raciocínio sobre tal questão. Continue Lendo “SUS: quem defende não usa, quem usa não defende…”
Oito mais oito, noves fora, zero…
Tenho sido bastante crítico em relação ao que se denomina no Brasil, impropriamente a meu ver, de “controle social em saúde”, mas em relação a esta 16ª Conferência Nacional de Saúde, realizada nesta última semana em Brasília, é preciso começar pelos elogios. Ela foi agraciada pela militância com o epíteto “8+8”, em homenagem ao grande evento de 1986, a Oitava CNS, que está na origem do SUS. Seu grande feito é o de ter sido realizada apesar do momento obscurantista, antidemocrático e contra participativo que se vive no Brasil, devidamente impulsionado pelo bolsonarismo. Nisso estão de parabéns seus realizadores, representados pelo Conselho Nacional de Saúde, demais conselhos de saúde e entidades civis de todo o país. O Ministério da Saúde, no qual está inserido o Conselho Nacional de Saúde (embora seus militantes prefiram considerá-lo externo ou estranho ao mesmo) garantiu em seu orçamento os recursos, que certamente não foram poucos, para que o evento ocorresse – é bom lembrar. O Ministro da Saúde compareceu e foi profusamente vaiado na abertura do encontro, mas ao que tudo indica, o mesmo fez questão de provocar tal reação, com suas alusões à Venezuela, lava jato, prisão de Lula e outros temas semelhantes, sem dúvida pouco sintonizados e adequados ao momento. A militância deve ter achado tal vaia o máximo, certamente arrolando isso como uma das “conquistas” do evento. Da mesma forma, o Ministro, como bom seguidor do ex-Capitão, talvez tenha encarado isso como ponto para si, pelo menos perante as milícias ideológicas governistas, um atestado de macheza e de destemor em enfrentar o segmento escolhido para ser responsável pelas mazelas do país, ou seja, a esquerda. De minha parte, lamento, pois coisas assim não fazem parte das boas normas democráticas e assim se desperdiçou o que seria bom momento para debate, não para troca de hostilidades. Aliás, nisso, a egrégia plenária do “controle social em saúde” se equiparou, lamentavelmente, ao bolsonarismo mais “raiz”. Mas vamos ao que interessa… Continue Lendo “Oito mais oito, noves fora, zero…”
Como evoluiu a situação de saúde no DF nos últimos anos?
Em número especial da revista Ciência & Saúde Coletiva, conforme já divulgado neste blog (ver link), especialistas da UnB, da UFG e da Codeplan-DF analisam a evolução da situação de saúde no Distrito Federal entre 2005 e 2017, comparando alguns indicadores com os da região Centro-Oeste e do país como um todo. Os números mostram que o DF apresenta melhoria na taxa de mortalidade infantil entre 2006 e 2016, de 18,3% para 10,3%, uma das menores do país. A detecção de AIDS apresentou tendência de queda (21,3%) no mesmo período, resultado também positivo quando comparado aos dados da região CO e do Brasil. Em relação tuberculose, constatou-se um dos menores coeficientes de incidência e mortalidade do país, bem abaixo da média nacional. Da mesma forma, na hanseníase ocorreu importante redução da taxa de detecção anual bem como de incapacidade. No caso da sífilis congênita em menores de um ano, ocorreu aumento nos últimos anos no Brasil, eCO, mas também no DF, com taxas de 2,56 e 4,7/1.000NV no período considerado. Qual a importância de tais informações? Veja a seguir. Continue Lendo “Como evoluiu a situação de saúde no DF nos últimos anos?”
